sábado, 28 de janeiro de 2012

insight

O trem rubro passa como se saído de um gatilho em fúria.

De cabelo preso em coque malfeito, ela sente gelarem seus ouvidos nus. Caminha com um pouco de pressa, desajeitada sobre os paralelepípedos musgosos, ansiosa para se aquecer no aconchego de casa ao se afastar da plataforma. O sol, supostamente a horário de pino, se encontra tímido por trás de uma muralha de vapor leitoso.

Ao postar-se de frente aos degraus longilíneos da saída da larga construção, como se n'um farfalhar de algo em seu âmago, perde a pressa. Furtividade ida, olha aos lados a fim de entender o ocorrido.

Obviamente, não encontra a resposta no que vê. Transeunte ou pedra lapidada nenhum lhe ilumina ideia.

Olha pra frente enquanto alguns pombos imundos alçam voo, ventania vindo e formando uma auréola de fiapos de seu próprio cabelo ao redor de seu rosto inexpressivo.

Sente como se tivesse deixado algo escapar.

Com o vestido de cor crua balançando de leve ao seu redor, se pergunta apenas se perdeu essa coisinha há pouco ou se deixou o pedaço fugir há mais tempo.

domingo, 15 de janeiro de 2012

melhor de duas

já quando criava asco
a essa melancolia fria
pairando em teima
por demasia

tu sutilmente, assim
brotou cá

tal qual ciranda
em meio a balanço de parquinho,
cantarolar açucarado
descoordenado, e
ao léu

samba de criança

tu vagalumeou pra cá,  
serena
plantou tua alegria na minha
de leve, a rir
porque, oras
quis

sopraste tempero
na minha monotonia

domingo, 1 de janeiro de 2012

22:43

ar pesado
tépido terroso
na taverna tal

adentra cá
guria magra vestindo de preto
pisando a passo torto
recolhida
doendo

chama o garçom, diz que quer é beber
o moço
só quer que ela diga o quê

pulsos tensos
o olhar meio aguado
embaçado
ela profere a favorita
rapaz assente e diz que traz

vira pra si
si mesma

o pensamento tentando
(só e apenas) tentando
se desvencilhar do peito

agora tão gelado
quanto o copo curto ao qual se agarra,
faz de si mercê
a engolir choro

em uma cena tão clichê

sábado, 24 de dezembro de 2011

timidez

dois na rua
ela de sacola na mão
o moço
lembro que não

na boca do prédio
rapariga de olho apertado
(culpa desse sol)

o arrastar do chinelo
áspero
lá cá lá cá
no negrume dos paralelepípedos

conversa torta
ao ritmo do ondular do ar bafado
palpável
cheio de sol

rapaz de sorriso frouxo
menina de lenço em laço de lado
soltando palavras

gostam-se faz tempo

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

oppum

frio úmido, andares fugazes e sol tímido
como se em uma reviravolta, montanha russa
-finalmente- o aconchegar chegar
em um naco de outono

árvores nuas e tapete nas ruas
adocicada rasgante gelada
urge a serenidade
tosca, marrom, amarelada

olha de esgueio
mistura o vento

ri pra mim

terça-feira, 18 de outubro de 2011

cirque

caros
senhora senhor e pequenos
cá sobre lustroso picadeiro,
veis, deslumbramte impassível
retumbante insensível
o acaso!, por assim
chamar

vos cabeis o aclamar

poderoso por si só...
não
poderoso conosco
vida minha tua dele
a equilibrar-se em fio único
linho a bambolejar, segmento de cabelo
que mais parece o nada

rufem os tambores

lã de meio termo entre
céu e terra e caos:
não vos garanto que de lá,
nosso artista não cairá
com baque surdo a vos sobressaltar

joguem os dados

esse é o ponto:
não há de prevê-lo, meus prezados
cidadãos desalmados.
hipocrisia espetaculosa é regra

surpreendei-vos e aproveitai a apresentação
dela sei que, apesar de tudo
nada aprenderão

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

alma da rua

eis que ao meio-dia
o calçadão de centro velho se abre
e fiel à imaginária percussão
cá vem excêntrico, a abrir passagem 
o homem do acordeão

dono de voz mirabolante e floreada
a casar-se com as notas
seus livres respirares
que de já costume suspiram anedotas

rima, improviso e harmonia
xícara de sol e três colheres de utopia

andarilha cá e 
por vez ou outra
dança lá

puxa o vento pr’uma valsa popular

de seus manejares leves graciosos
brota o encanto, que amável
colore viela

óleo sobre tela